Em audiência pública, ativistas e autoridades defendem políticas para a juventude negra
CLDF promoveu o debate como parte do Novembro Negro, quando é celebrado o Dia da Consciência Negra (20/11)
Em parceria com movimentos sociais, a Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) realizou uma audiência pública para debater a realidade da juventude negra no DF. O evento aconteceu nesta terça-feira (11), por iniciativa do deputado Gabriel Magno (PT) em conjunto com a Uneafro, o Movimento Negro Unificado do DF (MNU/DF), o projeto Jovens Defensores Populares, entre outras organizações.
Os participantes abordaram os desafios enfrentados pelos jovens negros, como a violência policial; a evasão escolar e o desestímulo à formação em nível superior; a precarização e “uberização” do trabalho; a militarização das escolas, com o cerceamento da identidade racial dos estudantes (como a exigência de retirada de dread e black power dos cabelos); a infraestrutura precária nas periferias; a dificuldade de acesso a espaços de poder e de tomada de decisões, entre outros aspectos permeados pela temática racial.
A audiência reforçou a importância de políticas públicas que promovam a igualdade de oportunidades e a melhoria das condições de vida da população negra. A produtora cultural do Instituto Drag, Ruth Venceremos, ressaltou que “o Distrito Federal expressa profundas desigualdades raciais e territoriais. A cor da pele e o CEP ainda definem o destino da nossa juventude no DF”.
Ela citou vários dados que revelam o contexto atual: “O risco de homicídio para pessoas negras é 2,7 vezes maior que para não-negras. Setenta e três por cento das mortes de jovens entre 19 e 29 anos são de pessoas negras. Apenas 7,8% dos nossos jovens concluem o ensino superior”.
Para Ruth, essa realidade exige resposta do Estado e não de “solidariedade social”. “O que nós precisamos é uma política de Estado que faça um enfrentamento ao racismo estrutural, que crie políticas públicas para que a nossa juventude consiga ter trabalho, ter moradia, ter as condições para continuar vivendo, ter oportunidade”, afirmou.
O presidente da Comissão de Educação e Cultura da CLDF, deputado Gabriel Magno, defendeu três eixos de ações estatais para os jovens negros: o acesso à educação, sem militarização das instituições de ensino; o combate à letalidade de pessoas negras em ações de segurança pública; e a promoção de justiça climática.
“As desigualdades climáticas têm muito a ver com racismo ambiental. Nós vivemos isso no DF, basta ver quais são os locais mais impactados com alagamentos nas chuvas. É fundamental pensar nas políticas de infraestrutura e de saneamento nos territórios que são mais vulneráveis e concentram a maioria da população negra”, analisou Magno.
O parlamentar enfatizou que o Distrito Federal é uma das unidades da federação mais desiguais do país e que o orçamento local deveria ser direcionado para a redução dessas desigualdades, no lugar de renúncias fiscais para empresários.
Segundo o deputado, as renúncias aumentaram progressivamente desde 2019 e vão chegar a R$ 10 bilhões no próximo ano. “É quase o orçamento inteiro da educação”, comparou Gabriel Magno, defendendo o remanejamento do valor para setores como transporte público, obras de infraestrutura, programas de moradia, iluminação, educação e saúde.
O deputado distrital Max Maciel (PSOL) reforçou que as dificuldades no acesso à educação e ao emprego não são questões individuais. “Muita gente vai atribuir a culpa ao indivíduo — porque ele não quer, não se esforçou, não foi atrás — mas a realidade é que nós ainda temos um Estado cruel com a sua juventude negra e periférica. Um Estado ainda hostil para essa parcela da sociedade, a qual atribui a culpa e a penalização, não um projeto garantidor de direitos”, refletiu o parlamentar.
A estudante Amanda Rodrigues, coordenadora-geral do grêmio estudantil Jovens Ativistas, do Centro Educacional Gisno, disse que “a violência que acontece nas periferias, feita por policiais, está sendo levada para dentro das escolas públicas, nos privando da liberdade de expressão, de mostrar a nossa cultura e a nossa história”.
Amanda considera que somente será possível mudar a realidade da população negra com “projetos antirracistas e, principalmente, com educação de qualidade, valorizando o trabalho de professores, incentivando os jovens a continuar os estudos e com estruturas e espaços seguros para as nossas vivências”.
Uma das políticas apresentadas durante a audiência foi o projeto Jovens Defensores Populares, proveniente de parceria entre a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Secretaria Nacional de Juventude e a Secretaria de Acesso à Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
“O objetivo desse projeto é construir lideranças jovens para atuar nos seus territórios, para que eles sejam agentes de transformação e de identificação inclusive das violações dos seus direitos”, explicou o coordenador do Jovens Defensores no DF e integrante da Uneafro, Gabriel Sales.
Ele falou sobre a mudança de paradigma no orçamento público. “O dinheiro que saiu para financiar esse projeto veio do Fundo Nacional de Segurança Pública, o mesmo que compra as munições que matam corpos negros, que matam a juventude negra. No Distrito Federal, com esse mesmo dinheiro, estamos financiando a formação de 120 jovens”, analisou.

Gabriel Sales também ressaltou a importância da audiência pública. “Construir uma audiência pública sobre o Novembro Negro e a realidade das juventudes negras do Distrito Federal não é algo simbólico. Ela faz parte de uma afirmação da nossa memória, da nossa luta, da nossa existência e da nossa resistência”, afirmou. O evento completo está disponível no YouTube da TV Câmara Distrital.



